terça-feira, 7 de dezembro de 2010

O Cio da Terra

Comp.: Milton Nascimento / Chico Buarque

Debulhar o trigo
Recolher cada bago do trigo
Forjar no trigo o milagre do pão
E se fartar de pão

Decepar a cana
Recolher a garapa da cana
Roubar da cana a doçura do mel
Se lambuzar de mel

Afagar a terra
Conhecer os desejos da terra
Cio da terra, a propícia estação
E fecundar o chão

domingo, 5 de dezembro de 2010

Por uma geografia do poder - (O quadro de Goya) - Raffestin

Por Cleiton Costa Denez - http://geografiageoradical.blogspot.com

O quadro de Goya foi usado na capa do livro:
Pour une géographie du pouvoir (por uma geografia do poder) de Claude Raffestin, ele representa as tramas do poder segundo Raffestin:



Don Manuel Osorio de de Zuniga - Goya

Ao escrever isso nos vem à memória um quadro de Goya que, para além do que representa, expressa com incrível precisão o complexo emaranhado da trama que as relações de poder tecem nos espetáculos mais insignificantes. Pensamos neste Don Manuel Osorio de Zuniga, que coloca em cena uma criança e seus brinquedos "vivos". A criança vestida de vermelho, o ator por excelência, e também os animais dispostos aos seus pés, à direita, à esquerda e a frente, compõem o significado do espaço do quadro. O significado do espaço também é dado pelas relações mantidas pelos elementos desta composição. A obra de Goya é uma fascinante metáfora pictural de sistema de poder. Sem dúvida a criança domina por sua presença realçada pelo vermelho, mas só domina porque todas as relações passadas, presentes e futuras passam por ela. É ela que quem segura o cordão que prende o pássaro colocado à sua frente, cujos movimentos potenciais são determinados pela maior ou menor liberdade que a criança lhe proporcionará. Á direita dela, três gatos, cuja cabeças ocupam os vértices de um triângulo imaginário, têm o olhar voltado para o pássaro, no qual vêem um trunfo para a violência deles.

Violência contida, prestes a se manifestar, mas que a presença da criança impede. Prova disso é a falta de medo do pássaro, que se esforça em levantar uma carta com o bico. Do lado esquerdo da criança, uma gaiola contendo outros pássaros menores expressando o caráter de prisão em segundo plano, do espaço construído. Todos esses animais são trunfos para a criança que os controlam e com eles matem relações de poder. Contudo, bastaria que cessasse a convenção - que mantém os gatos em repousa - para que a cena se animasse e se revertesse em drama. A criança também é o trunfo destes animais; é tanto prisão como garantia; ela faz pesar sobre eles a ambigüidade de sua vontade. É a medida da incerteza e a parte do acaso, para eles e para si. É, portanto, a representação de um equilíbrio entre uma infinidade de desequilíbrios brios possíveis que podemos imaginar, mas não verificar. As relações de poder se escrevem numa cinemática complexa. (RAFFESTIN, 1993, p. 6-7)


BIBLIOGRAFIA:

RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. Tradução de Maria Cecília França. São Paulo: Ática, 1993.